Entidade denuncia censura a filme que seria exibido no Cine Brasília
Quem se preparava para ocupar uma das seiscentas poltronas do belo Cine Brasília, um dos raros “cinemas de rua” do país, deve descartar o programa previsto para o dia 19 de setembro, às 19h. O documentário de longa-metragem O Deserto do Deserto não está da grade oficial da programação do Cine Brasília, que deveria ser exibido em sessão única e gratuita.
É isso que informa Nota de Esclarecimento emitida na quinta-feira, 12 de setembro, pela Associação de Solidariedade e pela Autodeterminação do Povo Saaraui (Asaauraui). De acordo com a Nota, após confirmação oficial, a Box Cultural, administradora do Cine Brasília, cancelou a exibição do documentário. A Box Cultural faz parte do escopo da Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa do GDF (Secec), onde, segundo a Nota, tramitaram ofícios com a solicitação de exibição do filme.
Cine Brasília Foto: Divulgação
Até terça-feira, 17 de setembro, dois dias antes da exibição prevista, a programação oficial do Cine Brasília não incluía na grade o filme O Deserto do Deserto. Segundo Francisco Márcio, coordenador de Audiovisual da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do GDF (Secec), a programação semanal definitiva só é repassada pela Box Cultural às 18h das quartas-feiras. Por essa razão, disse o coordenador, não seria possível saber se o filme seria ou não exibido na quinta-feira, 19.
A informação do coordenador de Audiovisual da Secec, confirmada pela Box Cultural, contraria o conteúdo da Nota da Associação de Solidariedade e pela Autodeterminação do Povo Saaraui, que diz: “a exibição de O Deserto do Deserto ficou agendada e confirmada com o Cine Brasília. A Associação iniciou a divulgação. A repercussão foi maior do que a esperada, até por seus diretores”.
Cena do filme O deserto do Deserto”
Foto: Divulgação
Mas por qual razão o documentário de Samir Abujamra e Tito González não está na grade de programação do Cine Brasília? Segundo a Nota publicada pela Asaauraui, a suspensão é atribuída à pressão do Marrocos sobre o Governo do Distrito Federal: "Uma coisa é o povo brasileiro respeitar e acolher outros povos, prestar solidariedade a todos, manifestar-se livremente contra opressões de qualquer tipo. Outra coisa é um país estrangeiro ditar regras na nossa capital".
Estaria a população do Distrito Federal vivendo um episódio de censura, como denuncia a Nota de Esclarecimento publicada pela Asaauraui? Para refletir sobre essa questão, voltemos ao dia 3 de agosto de 1988, quando foi votada, na Assembleia Nacional Constituinte, a nova Constituição Federal, cujo conteúdo faz referência ao tema da censura, que havia vigorado como política de controle durante o Regime Militar (1964-1985). Ao oficializar o fim da censura no país, o documento acaba com o cerceamento da liberdade de expressão intelectual, artística, científica, comunicativa. Convém, então, analisarmos a situação que motiva a denúncia da Associação de Solidariedade e pela Autodeterminação do Povo Saaraui contra o Governo do Distrito Federal.
Qual a relação entre os saharauis e o Marrocos?
Os saharauis vivem há mais de 4 décadas na condição de refugiados e apátridas em sua própria terra, o Sahara Ocidental, ocupado pelo Marrocos em 1974. Desde então, o povo saaraui luta contra a invasão do Marrocos, que busca anexar seu território de cerca de 266 mil km², no norte da África, rico em fosfato e com vasta costa marítima voltada para o Atlântico.
Para os saharauis, o bem mais precioso é a água. Embora na região não exista agricultura, uma gota d’água faz nascer um arbusto, uma acácia ou espinhos que servem para alimentar camelos.
Os saharauis veem na informação a maior arma contra a guerra. Como o conflito é praticamente desconhecido, eles tentam usar a internet para difundir informações sobre o que se passa no Sahara Ocidental. Para isso, dispõem de placas solares que geram energia e a própria internet.
Nesse sentido, documentário O Deserto do Deserto, ao abordar uma história pouco difundida internacionalmente, cumpre a missão de mostrar como vive o povo Saharaui, confinado desde os anos 1970 até os dias de hoje.
Foto: Divulgação
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